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Homossexualidade e profissão repórter: ponderações


Tomo consciência de mim, originalmente, através dos outros: deles recebo a palavra, a forma e o tom que servirão para a formação original da representação que terei de mim mesmo (Mikhail Bakhtin. Estética da criação verbal, 1992)

Fotografia de Robert Mapplethorp (Derick Cross, 1982)

Este texto é mais passional do que uma reflexão sobre algo específico – talvez seja ambos, não sei. É iminente (justificando sua tônica mais emotiva, portanto) porque me fez pensar e reunir dois assuntos que me tocam profundamente… bem, não é exatamente isso; um deles é, pelo menos, o que entendo ser parte de mim, uma espécie de gene. Então: vou falar de sexualidade e de jornalismo.

O tempo é produtor de algumas mudanças, certas maturações: uma delas, no que diz respeito à discussão e ao estudo da sexualidade, foi o abandono, do ponto de vista político, do tom vitimista; daquela abordagem sempre emotiva do drama de ser homossexual numa sociedade frontalmente contrária a isso; daquela abordagem vitimista em que homossexuais (nisso falo dos LGBT como um todo) são uma parte frágil, ofendida e marginalizada desta nossa complexa estrutura social.

As razões para o abandono dessa perspectiva são várias – e eminentemente políticas também. Entretanto, não é meu objetivo falar delas. Justamente o oposto. O que me levou a escrever esse post hoje foi ter assistido ao programa Profissão Repórter, da Rede Globo. Tema da edição de onze de maio deste ano: como as famílias lidam com a homossexualidade dos filhos. [1]

Pintura do canadense Steve Walker (Circle of Life, 2001)

Ao assistir aos trinta minutos do programa, em dois vídeos, recobrei aquela sensação (alegre em si) da empatia. Mesmo que a partir de sensações e situações produzidas pela dor, tristeza e solidão. A importância de recobrar esse sentimento de identificação reside na permanente necessidade, a meu ver, de não nos esquecermos de que somos muita sensação e um pouco de racionalidade – ainda que, no atual modelo social, sejamos tencionados à racionalização máxima das práticas.

Bem, mas sendo eu, por natureza, absolutamente identificado àqueles dramas ali expostos, a empatia não é de se estranhar. De fato. O que me alegrou, então, foi poder recolocar (enquanto indivíduo) a centralidade das sensações frente a esta brutal necessidade de estar sempre combatendo a homofobia; de estar sempre com argumentos em mente; sempre atento à violência institucional, estatal e cotidiana; de estar permanentemente pronto para se contrapor à verborragia relígio-cultural que marginaliza os homossexuais; enfim, de estar numa constante guerra (mental) contra não uma violência pontual (a agressão) e isolada (do vizinho), mas sim contra uma violência que é cultura, que é modus operandi e que é massiva. É uma guerra claramente desigual: perdem-se quase todas as batalhas na esperança de, num futuro em que seremos enfim civilizados, vencer a guerra contra o preconceito – e tudo será melhor. Leia o resto deste post